terça-feira, 7 de janeiro de 2014

O Riso


O riso não tinha clemência. A boca tremia, a língua vacilava, a voz emudecia. Mas o riso trincava a bochecha.
E era feio. Não apenas feio. Era doentio. Seco, cru, como se alguma coisa estivesse gravemente errada. Não
sei exatamente o momento que pude notá-lo, mas sei que a sombra pairava ao eu lado, assim como estranhas trombetas,
em uníssono, cantavam uma marcha fúnebre. O riso não tinha face. Não havia dentes. Na verdade, nem mesmo sei se
havia boca. Era como se nada daquilo fosse verdade. Você olha para os lados, procurando as câmeras escondidas, o
apresentador de tevê esperando a deixa para entrar. Não há. As vitrines o escondem. O riso não há. Olhava. Olhei.
Era coisa da minha cabeça? Tudo é coisa da cabeça, mas uma coisa eu sei: o riso era maior que ela. O riso rasgava
a carne, alcançando as orelhas. Os lábios eram grandes e pequenos. A abertura, um canal vaginal. Nada ali lembrava
realmente uma boca. Um sorriso. Aquela figura alta, esguia, nada significava. Era horrível. Horrível! Corri o mais
rápido que pude, esbarrando nas pessoas, que me respondiam com xingamentos ao longe. Gritos atormentados me furavam
os tímpanos. Calafrios percorriam o meu corpo. Mas nada disso se comparava ao sorriso. Ao maldito riso. Não havia
rua. Não havia pessoas, nem luz do sol. Nem mesmo havia o riso. Diabos, nem mesmo havia eu. Só restava o riso.
Acho que eu nem existia mais.
E de repente do riso fez-se o pranto...

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